quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Lei posterior mais gravosa - quando se aplica.

Na última semana, em sala de aula, supomos a seguinte situação:

Caio, Tício, Mévio e Tibúrcio, este último com 16 anos de idade, uniram-se, em agosto  de 2013, para os fins de cometer crimes de roubo. Para tanto, contavam com a posse de duas armas de fogo.  A quadrilha deu início aos assaltos ainda no mês de agosto sendo que as atividades criminosas continuaram até novembro de 2013, quando foram presos os agentes maiores de idade.

Responderão os agentes maiores pelo disposto no parágrafo único do artigo 288 conforme o texto anterior à modificação da Lei  12.850/13, com vigência em 19/09/2015? Ou responderão pelo parágrafo único do artigo 288 com o novo texto legal?

Texto anterior:

"A pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado."

Texto posterior:

"A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente".

A questão é interessante na medida que a nova legislação é mais branda quanto à posse de armamento enquanto é mais gravosa quanto à participação de adolescente no seio da associação criminosa, então vejamos como entendo a questão:

a) Quanto ao uso de arma pela quadrilha/associação criminosa:  a questão deverá ser resolvida pelo inciso XL, artigo 5°, da Constituição Federal c/c o artigo 2°, parágrafo único, do Código Penal.

Art. 5°, XL, CF - "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu".

Art. 2°, parágrafo único, do CP - "A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado".

Ou seja, uma vez que a legislação penal posterior favoreceu o agente, esta, obrigatoriamente, deverá ser aplicada, como no caso do uso de arma em associação criminosa, cujo delito estendeu-se entre a lei anterior (mais gravosa) e lei posterior (menos gravosa).


b) Quanto à participação de adolescente (ou criança) na composição da associação criminosa:

Anterior à modificação legal, casos como este de nosso exemplo, resultariam em infração ao artigo 244-B, do Estatuto da Criança e do Adolescente, com pena mínima de 01 (um) ano de reclusão. Ou seja, também quanto à este ponto a lei posterior foi mais benéfica, devendo ser aplicada ante as regras acima indicadas.

Contudo, vamos ignorar a disposição do ECA e supor que não havia previsão de punição para a participação de adolescente ou criança em associação criminosa, ou seja, caso em que a legislação posterior agravou a pena (em nossa suposição teria criado uma pena inexistente). Ante este fato perguntamos ao leitor se as previsões legais de não retroatividade anteriormente vistas deverão ser aplicadas, tendo em vista que a associação criminosa é crime permanente e se estendeu no tempo de vigência das duas leis (uma favorável e outra contrária aos agentes).

A resposta é negativa, a situação, neste ponto, seria inversa, não há lei posterior mais benéfica, mas sim, mais gravosa, portanto não há que se falar em retroatividade de lei, mas sim no tempo do crime.

A pergunta a ser feita é: quando o crime foi praticado? Se na vigência da lei posterior, sendo esta mais gravosa, responderão os agentes pela nova pena.

Em casos de crimes permanentes, que se estenderam na vigência de lei posterior mais gravosa, ou seja, naqueles casos em que os agentes optaram pela manutenção do crime no vigor da nova lei, responderão igualmente pela nova pena.

Tal assunto foi sumulado pelo STF - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

No caso, ante as circunstâncias diferenciadas pelo parágrafo único do Art. 288, do CP, entendo que seriam coexistentes as regras da Súmula 711 e do inciso XL, do art. 5/, da CF.

Contudo, lembro que é apenas uma suposição, eis que também a participação de adolescente ou criança na associação criminosa trouxe uma diminuição da pena.

Abraço a todos,






segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Conceito de Inquérito Policial

Caros, após um longo tempo de ausência, estaremos postando novas e curtas matérias sobre processo penal e direito penal, visando o reforço ou ampliação do conhecimento pertinentes.

E voltamos com um conceito de Inquérito Policial, um dos poucos que recomendo a decoreba, eis que útil em várias situações. 

Embora vários autores apresentem conceito de Inquérito Policial, me agrado de uma mistura e simplificação que resulta no seguinte texto:

O IP é um procedimento administrativo, que tem por objetivo a apuração de fatos delituosos e a respectiva autoria, para que o titular da ação penal possa promove-la.

Uma das conclusões que extraímos deste conceito é que, em sendo procedimento administrativo que visa informar o dono da ação penal, é que irregularidade existente nesta fase indiciária não atinge a ação penal.

Na presentes data, tomei ciência de decisão relativa a Recurso em Sentido Estrito, na qual o Tribunal de Justiça Catarinense assim decidiu:

[...]
2. Tem-se como inócua, em sede de recurso, a discussão acerca de ilegalidade em peças relacionadas à fase indiciária, porquanto os elementos colhidos na fase policial possuem mera natureza informativa, servindo somente de substrato ao representante do Ministério Público a fim de viabilizar a propositura da respectiva ação penal.
[...] - Recurso Criminal 2014.001399-0 - TJSC.

Embora a decisão possa ser teoricamente questionada, serve-nos para alerta de que o IP não é processo, tampouco se sujeita à suas regras e características.

Abraço a todos,




quarta-feira, 18 de junho de 2014

Joaquim Barbosa e a suspeição.

No decorrer desta semana o Ministro do STF, Joaquim Barbosa, deixou a relatoria das execuções penais relativas à Ação Penal 470 (mensalão).

A decisão foi tomada após discussão entre advogado e ministro veiculada nacionalmente e a consequente representação criminal formulada pelo Ministro por ameaça proferida pelo Advogado.

Vamos ao que interessa sob a ótica do Processo Penal.

Na lei processual encontraremos causas que impedem o exercício da jurisdição e outras que tornam suspeito o julgador, assim:

1) São causas de impedimento (não poderá exercer jurisdição):

a) a atuação no processo de cônjuge ou parente até terceiro grau (em qualquer função dentro do processo, mesmo a de delegado, auxiliar da justiça ou parte);

b) a própria atuação no processo em desempenho de quaisquer funções que não de juiz, ou ainda como parte;

c) a própria atuação no processo em instância inferior, desde que tenha se pronunciado sobre a questão.

2) São causas de suspeição:

a) a amizade (íntima) ou inimizade (capital) com qualquer das partes;

b) se o magistrado, cônjuge, ascedente ou descendente responder a processo análogo, cujo caráter criminoso haja controvérsia;

c) se pessoalmente ou algum parente (até terceiro grau) sutentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;

d) se tiver aconselhado qualquer das partes;

e) se for credor, devedor, tutor ou curador de qualquer das partes;

f) se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.


Estas são as causas arroladas pelo CPP que causam impedimento ou suspeição do julgador. Basta então verificar em qual delas podemos enquandrar a situação vivida no STF.

Abraço a todos,

terça-feira, 10 de junho de 2014

Requisitos à prisão preventiva.

Nesta tarde, recebi inquérito policial com representação da autoridade policial pela prisão preventiva de Mévio e Tício (sim os nomes são fictícios), eis os fatos:

a) Mévio e Tício praticaram assalto na cidade de Itajaí/SC, pelo qual foram reconhecidos em dia posterior;

b) Ambos ainda foram reconhecidos pelo comprador dos produtos subtraídos por ambos;

c) No decorrer das investigações, Mévio e Tício entraram em contato com a vítima, via telefone, ameaçando-a caso os entregasse à polícia;

d) A autoridade policial representou pela prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública, eis que Mévio e Tício possuem reincidência em crime da mesma espécie.

Processualmente o que temos:

1) Um instrumento adequado: enquanto o representante do Ministério Público, o querelante ou o assistente requerem a prisão preventiva, a autoridade policial representa pela prisão preventiva (Art. 311, do CPP).

2) Uma fundamentação insuficiente: tendo em vista o fato de que os indiciados mostram-se voltados à atividades criminosas, das quais não se afastaram após condenação anterior, entendo que possível a interpretação que ordem pública estará prejudicada com os réus soltos (há entendimentos diversos), contudo, o requisito óbvio a autorizar a prisão preventiva é a ameaça à testemunha, ou seja, a prisão dos indiciados (futuros réus) visa a conveniência da instrução criminal. (Art. 312, do CPP).

Em suma, ante a existência de indicios de autoria e prova da existência do crime + conveniência da instrução criminal, possível a prisão preventiva dos indiciados, conforme representado pela autoridade policial. Neste sentido oferecido o parecer.

Abraço a todos,

 

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Da proibição da oitiva de determinadas testemunhas.

Postagem curta, porque hoje é sexta:

Em matéria de prova em processo penal, importante saber que algumas testemunhas são proibidas de depor.

Segundo o artigo 207, do CPP, são proibidas de depor, aqueles que em razão da profissão, ofício ou função devam guardar segredo. Dentre estes poderíamos citar o sacerdote, o advogado, médico, juiz ou membro do Ministério Público que atuaram no inquérito ou processo.

Todavia, a lei abre exceção caso a parte interessada desonere o profissional, lembrando que a parte interessada não é só aquele que repassou a informação, mas, segundo parte da doutrina, também o órgão de classe ao qual pertence o profissional.

Por fim, destacamos que  a proibição não se vincula à profissão ou ao profissional em si, mas ao conteúdo do que porventura saiba por conta da profissão, logo, não estará um advogado proibido de depor sobre um crime qualquer que tenha presenciado.

Por hoje é só,

Abraço a todos,

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Um processo, dois juízes. E o princípio da identidade física?

Segue interessante decisão do STF:
 
Negado HC que pedia nulidade de processo por atuação de dois juízes

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu o pedido de Habeas Corpus (HC 121624) impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que a defesa de um condenado pedia a nulidade do processo alegando a não observância do princípio da identidade física do juiz, pois o magistrado que proferiu a sentença não foi o mesmo que presidiu a instrução processual (produção de provas). De acordo com o ministro, a atuação do juiz substituto neste caso se enquadra nas exceções previstas no artigo 132 do Código de Processo Civil (CPC), não configurando constrangimento ilegal a ser reparado.
De acordo com os autos, o sentenciado comercializava CDs e DVDs piratas e medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que resultou em sua condenação à pena de 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado, e mais 20 dias-multa, pela prática dos crimes de violação de direito autoral (artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal – CP) e falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (artigo 273, parágrafo 1º-B, I, do CP).
A defesa alega que o fato de a sentença ter sido proferida por juiz substituto em abril de 2009, durante período de férias do juiz titular da 2ª Vara da Comarca de Barra Grande (SP), que presidira a instrução, e que a decisão foi publicada depois que o juiz titular já havia retornado a suas funções, violando os princípios da identidade física do juiz e o do juiz natural.
Decisão
O ministro Gilmar Mendes destacou que o princípio da identidade física do juiz apenas foi expressamente introduzido no Código de Processo Penal (CPP) com o advento da Lei 11.719/2008, que incluiu no artigo 399 dispositivo estabelecendo que o juiz que presidiu a instrução deverá também proferir a sentença. Ressaltou, entretanto, que a aplicação do princípio não é absoluta, permitindo flexibilização nas situações excepcionais previstas no artigo 132 do CPC, como nas hipóteses de convocação, licença, promoção, aposentadoria ou afastamento do magistrado por qualquer motivo.
Citando precedentes das duas Turmas do STF, o relator observou que a jurisprudência do Tribunal é no sentido de que exista correlação entre as provas colhidas durante a instrução e a sentença, ainda que proferida por outro magistrado. O relator destacou o Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 116205, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, que assenta a necessidade de moderação na aplicação do princípio do juiz natural de forma que a sentença seja anulada apenas “nos casos em que houver um prejuízo flagrante para o réu ou uma incompatibilidade entre aquilo que foi colhido na instrução e o que foi decidido”.
O ministro Gilmar Mendes entendeu não haver qualquer vício a ser reconhecido no caso. Destacou que o fato de o juiz titular encontrar-se de férias quando da conclusão dos autos para sentença é uma situação que se enquadra na expressão “afastado por qualquer motivo”, disposta no artigo 132 do CPC, que deve ser aplicado por analogia ao processo penal.
“Da mesma forma, é irrelevante a alegação de que o juiz titular teria retornado às suas funções antes da publicação da sentença, haja vista que no momento em que foi prolatada o referido magistrado ainda encontrava-se no gozo das férias”, concluiu o relator.
Competência
O ministro indeferiu monocraticamente o HC com base no artigo 192, caput, do Regimento Interno do STF, que delega competência ao relator para julgar, individualmente, pedidos de habeas corpus, desde que a matéria versada nos autos seja “objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal”.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Queixa crime já recebida. Perdão ou renúncia?

Na presente data me deparei com autos que apresentaram a seguinte situação:

a) Mévio ofereceu queixa-crime contra Tício, em face de calúnia, injúria e difamação por este praticadas;

b) Não houve conciciliação em audiência prévia;

c) Apresentada defesa preliminar e designada audiência de instrução e julgamento, Mévio apresentou em juízo a informação de que houve acordo na esfera cível e requereu a extinção da punibilidade pela renúncia ao processo.

Acertado o pedido de Mévio?

Nos parece que não, o momento à renúncia é anterior à queixa-crime e não posterior a esta, quando o instituto adequado é o perdão. Por sua vez, apresentado o perdão, deverá o querelado se manifestar a respeito do seu aceite no prazo máximo de três dias, o qual será presumido ante o silêncio da parte.

Em suma, em parecer lançado nos autos, nos manifestamos pelo recebimento da renúncia como se perdão fosse e pela intimação do querelado para manifestar-se no prazo máximo de três dias.

Abraço a todos,

terça-feira, 3 de junho de 2014

A falta de defesa preliminar em processo de tóxicos.

Na data de ontem analisei processo em que ocorreram os seguintes fatos:

a) Mévio foi denunciado, em 27/01/2010, por infração ao artigo 33, da Lei 11343/06 (tráfico ilícito de entorpecentes);
b) A notificação para fins de defesa preliminar foi cumprida em 22/02/2010;
c) A defesa preliminar, na qual constava rol de testemunhas, foi juntada aos autos em 08/03/2010;
d) Em 23/04/2010, a defesa preliminar, bem como o rol de testemunhas, não foram recebidos por intempestivos e o processo teve sequência com a designação de data para fins de audiência de instrução e julgamento.
e) Mévio foi condenado pelo crime praticado.

Segundo a Lei 11343/06, artigo 55, a defesa terá o prazo máximo de 10 (dez) dias para apresentar defesa preliminar, oportunidade para arrolar suas testemunhas, pelo que, de fato, intempestiva a defesa preliminar apresentada por Mévio.

Contudo, muito embora acertada a decisão quanto ao não recebimento da peça extemporânea, o fato é que a defesa premilinar é peça obrigatória e condição para  o posterior recebimento, ou não, da denúncia. Os doutrinadores Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho inclusive conceituam a defesa preliminar como condição de procedibilidade ou condição específica da ação. (Lei de Drogas - Comentada Artigo por Artigo. 2 ed. São Paulo: Método, 2008, p. 264).

Em apelação, Mévio alegou o cerceamento de defesa, no que obteve sucesso, com a anulação do feito a partir do recebimento da denúncia. Da decisão do Tribunal Catarinense extraímos:

"Assim, declara-se a nulidade do processo em relação ao acusado, a partir do recebimento da denúncia, inclusive , a fim de oportunizar a apresentação de defesa preliminar pela defesa do acusado, respeitando-se, o procedimento previsto nos arts. 55 e seguintes da Lei n. 11343/6, prejudicados os mérito do recurso interposto pelo apelante." Ap. Criminal 2010.070687-3.

Entendemos adequada a anulação do feito, contudo discordamos da forma operada pelo Tribunal, eis que a nosso ver, a ordem adequada seria pelo recebimento da peça defensiva, com exceção do rol de testemunhas, em face do princípio da Ordem Processual, dando-se continuidade ao feito a partir de então.

Abraço a todos,


segunda-feira, 2 de junho de 2014

Financiamento mediante fraude e competência.

No início da tarde de hoje recebi inquérito policial iniciado por  notitia criminis na qual uma empresa de financiamento informou a obtenção de um financiamento mediante uso de documentos falsos (fraude).

O inquérito policial foi concluído e então remetido ao fórum da Comarca de Itajaí/SC (Justiça Estadual) e, após, distribuído para a Promotoria de Justiça em que atuo.

O inquérito policial logrou apurar a autoria do fato narrado pela empresa financeira, contudo, não foi possível, neste momento, o oferecimento da denúncia, não em face da necessidade de novas diligências, mas sim, em virtude da incompetência da Justiça Estadual para processamento e julgamento do feito.

Muito embora o crime se assemelhe ao estelionato com previsão no Código Penal, o fato é que há crime específico, qual seja, aquele com previsão no artigo 19, da Lei 7492/86: "Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa."

Por sua vez, da mesma Lei, em seu artigo 26, colhe-se: "A ação penal, nos crimes previstos nesta Lei, será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça Federal."

Mas a Constituição não alterou tal competência? A nosso ver a resposta é negativa, o que também entende o STJ:

[...] OBTENÇÃO, MEDIANTE FRAUDE, DE FINANCIAMENTO EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. [...] STJ 2001/0239748-0 - julgado em 28/11/2012.

Logo, a competência para o julgamento nos casos de obtenção de financiamento mediante fraude é da Justiça Federal.

Abraço a todos,

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Férias.

Por motivo de férias, estaremos fora no mês de maio. Voltam as postagens em junho se Deus assim o permitir.


Abraço a todos,



quarta-feira, 30 de abril de 2014

Identificação e qualificação do denunciado ou querelado.

Semana passada falamos em sala sobre o conteúdo da denúncia (Art. 41, do CPP). Especificamente quanto à qualificação do acusado, lembrei-me de postagem anterior que traz um fato interessante:

1) Na comarca “A”, promotor de justiça apresentou denúncia por crime de estelionato e fez constar a qualificação do acusado da seguinte forma: “Severino da Silva, vulgo Ceará, com último endereço conhecido a Rua x, cidade y”.

2) O réu não foi encontrado, tampouco nomeou advogado para defesa, pelo que foi suspenso o processo por força do art. 366, do CPP, bem como foi decretada a prisão preventiva e expedido mandado de prisão.

3) Alguns anos após, ao buscar os órgãos policiais para segunda via de carteira de identidade, foi detido na comarca “B” Severino da Silva, vulgo Ceará.

4) O detido fez prova documental de que, quando dos fatos, estava trabalhando na comarca “B”, bem como alegou que nunca estivera e sequer conhecia a comarca “A”. Foi imediatamente posto em liberdade, eis que demonstrou não ser a mesma pessoa que havia sido anteriormente denunciada.
 
Juridicamente:
 
Do artigo 41, do CPP, colhe-se que a denúncia deverá conter, além do fato criminoso e suas circunstâncias, a classificação do crime, rol de testemunhas (quando necessário) e a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo.
 
Segundo CAPEZ (in Curso de Processo Penal): “qualificar é apontar o conjunto de qualidades pelas quais se possa identificar o denunciado, distinguindo-o das demais pessoas”.
 
Da leitura do art. 41, do CPP leva à conclusão que desnecessária a qualificação completa do acusado (filiação, CPF, número da carteira de identidade, etc), contudo é obrigatória a identificação do acusado pelos elementos de identidade propostos, os quais devem ser suficientes para individualizar quem está a sofrer a ação penal, sob pena de falecer uma das condições da ação penal, qual seja, o da legitimidade da parte, eis que impossível a verificação de sua existência em casos de qualificação/identificação deficiente.
Por sua vez, a falta de qualificação não impede a ação penal, desde que certa a identidade física. Do disposto do artigo 259, do CPP extraímos:
 
Art. 259. A impossibilidade de identificação do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará a ação penal, quando certa a identidade física. A qualquer tempo, no curso do processo, do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua qualificação, far-se-á a retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade dos atos precedentes.
 
No caso proposto, a qualificação deu-se de modo deficiente, eis que não apresentou elementos que possibilitassem a distinção entre denunciado e seus homônimos (xarás), agravado em face de tratar-se de nome e apelido bastante comuns.

Resumão:

a) a falta de qualificação não impede o exercício da ação penal.
 
b) a qualificação/identificação deve dar-se de forma a individualizar (tornar certa a identidade física) o acusado.
 
Abraço a todos e bom feriado.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Excesso de prazo e inquérito policial.

Vale a pena ver de novo:

Há constrangimento ilegal no excesso de prazo para término do Inquérito Policial?

Nesta tarde analisamos inquérito policial onde ocorreram os seguintes eventos processuais:

a) Em 11/07/2012, ás 19h00, a vítima Tício (vamos dar uma chance para o Tício e deixá-lo no lugar da vítima), dirigiu-se até a Delegacia de Polícia e registrou boletim de ocorrência noticiando que Mévio, na mesma data e algumas horas antes, subtraiu a quantia de R$ 2.100,00 em espécie do interior da residência ocupada por ambos.
b) Em 17/07/2012 a autoridade policial instaurou, mediante portaria, o inquérito policial.
c) No decorrer do inquérito o Delegado ouviu Mévio e Tício, bem como juntou boletim de identificação de Mévio.
d) O inquérito policial foi concluído, com relatório, em 21/03/13.
Dos autos e das informações acima expostas poderíamos tomar vários caminhos, mas nos centremos, para a presente data na questão prazo. Qual o prazo para conclusão do inquérito policial?
No caso que relatamos acima o prazo será o da regra geral do CPP, qual seja, 30 dias, eis tratar-se de réu solto (art. 10, in fine, do CPP).
Fica aqui uma dica, o prazo geral para oferecimento de denúncia é exatamente a metade, qual seja, 15 dias. A dica também serve para a situação de réu preso, 10 dias para o inquérito, 05 dias para a denúncia.
Outros prazos para conclusão do inquérito são:

Legislação
Réu preso
Réu solto
05 dias
30 dias
Lei de Drogas - 11343/06  (Os prazos poderão ser duplicados pelo juiz, ouvido o MP_ - Art. 51, parágrafo único)
30 dias
90 dias
Crimes contra a economia popular (Lei 1521/51 - art. 10, § 1°)
10 dias
10 dias
Inquérito Policial Militar (CPPM - Art. 20, caput, e § 1°) O prazo poderá ser prorrogado por mais 20 dias em caso de réu solto)
20 dias
40 dias
Inquérito Polícia Federal (Art. 66, da Lei 5010/66 - Só há previsão para o caso de réu preso, sendo o prazo de 15, prorrogável por mais 15 mediante autorização judicial).
15 dias

  
Voltando ao inquérito acima descrito, podemos observar que a autoridade policial não respeitou o prazo de conclusão do inquérito, eis que os 30 dias foram em muito ultrapassados. Pergunta-se: o excesso de prazo gera constrangimento ilegal?

A resposta dependerá da condição do indiciado, caso seja caso de indiciado preso, a resposta é positiva, caso o indiciado esteja solto, a resposta é negativa.

Da jurisprudência colhemos: “Estando solto o indiciado, não se vislumbra constrangimento ilegal na demora da conclusão do inquérito policial e sua remessa a Juízo”. (RT 496/285). No mesmo sentido HC 107.382 do STJ e inúmeras outras decisões.

Situação nova é a concessão de liberdade do indiciado ou réu mediante medidas cautelares, casos em que, embora solto, há condições que deverão ser cumpridas, conforme rol do artigo 319, do CPP (caso o seu código não traga as medidas cautelares no artigo 319, troque de código, a mudança deu-se em 2011).

Desconhecemos decisões a respeito, contudo, como as medidas cautelares causam obrigações que atingem a plena liberdade do indivíduo, cremos que o excesso de prazo, nestes casos, causa constrangimento ilegal, sob pena do indiciado permanecer indefinidamente (ou até que ocorra a prescrição), sob condições de restrição de direitos.

Por hoje então ficamos com as seguintes informações:

1) Não há constrangimento ilegal no excesso de prazo para conclusão do inquérito policial em se tratando de réu solto.

2) Há constrangimento ilegal no excesso de prazo para conclusão do inquérito policial em se tratando de réu preso.

3) Quanto ao constrangimento ilegal nos casos de réus soltos mediante medidas cautelares, aguardar posicionamento doutrinário e jurisprudencial (se quiser arriscar acompanhe o nosso entendimento).

4) Se o seu interesse é a prestação de concurso público, decore os prazos acima vistos, isto é necessário.

Abraço a todos,

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Julgamento Processo Crime Fernando Collor de Mello

Acompanhe a seguinte notícia do STF:
"STF julga improcedente ação penal contra ex-presidente Fernando Collor


O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente, na sessão desta quinta-feira (24), a Ação Penal (AP) 465, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o ex-presidente da República e atual senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL), pela suposta prática dos crimes de falsidade ideológica, corrupção passiva e peculato, previstos nos artigos 299, 312 e 317 do Código Penal, respectivamente.
A ação foi relatada pela ministra Cármen Lúcia, tendo como revisor o ministro Dias Toffoli. O ex-presidente era acusado de, entre 1991 e 1992, participar de esquema de direcionamento de licitações para beneficiar determinadas empresas de publicidade em troca de benefícios pessoais e para terceiros. Para tanto, ele se teria valido de um “testa de ferro” de nome Oswaldo Mero Salles (já falecido), tendo se beneficiado do esquema na forma de pagamento de pensão alimentícia a um filho nascido de relação extraconjugal. O esquema teria envolvido, também, a emissão de cheques em nomes de “fantasmas” e do uso de “laranjas”.
Ao defender a condenação, a vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko, sustentou que a análise dos autos levava à constatação de que o então presidente tinha pleno conhecimento dos fatos criminosos que ocorriam a sua volta, devendo aplicar-se ao caso a teoria do domínio do fato. A defesa, por sua vez, alegou inépcia da denúncia, cerceamento da defesa e ausência de provas de materialidade e autoria. Além disso, segundo a defesa, os contratos de publicidade sequer passavam pelo presidente da República, mas sim por uma comissão do Palácio do Planalto para examinar os contratos firmados e, segundo sustentou, nenhum membro dessa comissão foi alvo de qualquer denúncia de fraude.
Votos
Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia rejeitou a tese da Procuradoria Geral da República de que se aplicaria ao caso a teoria do domínio do fato, pois não existem provas concretas de que o então presidente tivesse conhecimento dos contratos de publicidade. Nesse particular, ela se reportou à afirmação da própria representante da PGR no sentido de que o servidor Oswaldo Salles não tinha relação próxima com o ex-presidente para agir em seu nome.
A ministra também disse que a doutrina consolidada do STF não admite que uma condenação se dê unicamente por depoimentos prestados no inquérito policial. Isso porque, segundo a relatora, testemunhas ou até corréus que, em depoimento no inquérito policial, confirmaram o envolvimento do então presidente no esquema de corrupção, não o confirmaram em juízo.
Por outro lado, ainda conforme a relatora, corréus ou informantes não podem ser admitidos como prova única para uma condenação, uma vez que não prestam juramento de dizer a verdade. Nesse sentido, a ministra citou diversos precedentes, como os Habeas Corpus (HCs) 90708 e 81618."
Pergunta-se:
Porque um ex-Presidente da República está sendo julgado pelo STF?
Não é por conta da Súmula 394 do STF, eis que já revogada (Sumula 394 - "Cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício".)
Também não é por força do § 1°, do Art.  83, do CPP, declarado inconstitucional pelo STF (Texto legal: "A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública".)
Logo, o ex-Presidente Fernando Collor de Mello não está respondendo a ação penal junto ao STF por conta de sua condição de ex-Presidente, mas sim porque atualmente ocupa cadeira no Senado Federal e a competência para julgamento de senadores, em se tratando de crimes comuns, é do Supremo (caso o crime seja de responsabilidade o julgamento se dará no próprio Senado).
Abraço a todos,
 
 
 

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Principio da adequação social e pirataria.

Vale a pena ver de novo:

DVD falso da Lady Gaga e o Princípio da Adequação Social.
Mévio resolveu mudar de ramo, deixar a desonestidade e passar a uma atividade legal. Então passou a adquirir CDs de música e DVDs de filmes na cidade de São Paulo e revender o material no Rio Grande do Sul. Mévio não deu muita importância que as capas eram de xerox em preto e branco e que o título vinha anotado no CD ou DVD com caneta hidrocor azul. Mévio sabia que o material era tão original quanto o tênis naique que tinha em casa, mas o negócio era bom, comprava a R$ 1,00 cada e revendia a R$ 5,00.

Surpreso, Mévio foi preso, lhe disseram que estava cometendo o crime previsto no artigo 184, § 2°, do CP.

Mévio achou um absurdo, já que muitos praticavam a mesma conduta, inclusive autoridades adquiriam seus DVDs, incluindo aqueles com shows da Lady Gaga. Contratou um advogado que traduziu a revolta de Mévio, alegando ao Juiz de Direito o Princípio da Adequação Social.

O argumento foi aceito, e Mévio absolvido. Após recurso do Ministério Público, o Tribunal manteve a absolvição. Foi então interposto Recurso Especial, que foi acolhido pelo STJ e ante a reiteração de casos similares, editou a SÚMULA 502 cujo teor é o que segue:

“Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas”.

Do voto da Ministra Maria Thereza de Assis Moura extraímos: “o fato de, muitas vezes, haver tolerância das autoridades públicas em relação a tal prática, não pode e não deve significar que a conduta não seja mais tida como típica, ou que haja exclusão de culpabilidade, razão pela qual, pelo menos até que advenha modificação legislativa, incide o tipo penal, mesmo porque o próprio Estado tutela o direito autoral”.

Resumo: Mais uma pena para Mévio, e a interpretação do STJ que o crime de pirataria não deve ser desconsiderado ante o princípio da adequação social.

Abraço a todos,

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Carta Precatória - intimação do Defensor Público

Na postagem de ontem verificamos que as partes (Processo Penal) devem ser intimadas da expedição da Carta Precatória, sendo desnecessária a intimação da data de audiência a ser realizada no juízo deprecado. Apresentamos jurisprudência do STF à qual podemos acrescentar a Súmula 273, do STJ.

Encerramos então com a seguinte indagação: E se acaso no juízo deprecado houver Defensoria Pública regularmente constituída e tratar-se de réu hiposuficiente, faz-se necessária a intimação do Defensor Público para a audiência?

A resposta é positiva, assim como o Membro do Ministério Público é intimado, da data da audiência, na comarca deprecada, assim também o será o Defensor Público. Do STF colhemos:

EMENTA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. EXPEDIÇÃO CARTA PRECATÓRIA. DEFENSORIA PÚBLICA. NOMEAÇÃO DE ADVOGADO AD HOC. NULIDADE PROCESSUAL RECONHECIDA. 1. Jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal – e na mesma linha a do Superior Tribunal de Justiça -, no sentido de que, intimadas as partes da expedição da precatória, a elas cabe o respectivo acompanhamento, sendo desnecessária a intimação da data designada para a audiência no Juízo deprecado. 2. Mitigação desse entendimento em relação à Defensoria Pública. As condições da Defensoria são variadas em cada Estado da Federação. Por vezes, não estão adequadamente estruturadas, com centenas de assistidos para poucos defensores, e, em especial, sem condições de acompanhar a prática de atos em locais distantes da sede do Juízo. Expedida precatória para localidade na qual existe Defensoria Pública estruturada, deve a instituição ser intimada da audiência designada para nela comparecer e defender o acusado necessitado. Não se justifica, a nomeação de defensor dativo, quando há instituição criada e habilitada à defesa do hipossuficiente. Nulidade reconhecida. 3. Recurso ordinário em habeas corpus provido.

RESUMO - É desnecessária a intimação do defensor do réu para fins de audiência na comarca deprecada, salvo, ser for o caso de atuação da Defensoria Pública.


Abraço a todos,

terça-feira, 22 de abril de 2014

Questão de concurso - intimação de carta precatória.

Vamos iniciar a semana com uma questão de concurso para Magistratura de São Paulo (concurso 174):

Expedida carta precatória para a inquirição de testemunha de acusação, em processo no qual o
réu vê-se processado pela prática do delito de roubo, a lei processual penal exige:

(A) a intimação das partes da expedição da carta precatória, a qual deverá ser efetuada pelo juízo
deprecante.
(B) a intimação das partes da expedição da carta precatória e a intimação do defensor para a
audiência que se realizará no juízo deprecado.
(C) a intimação das partes da expedição da carta precatória, bem como da data em que se realizará
a audiência no juízo deprecado.
(D) a intimação das partes da data em que se realizará a audiência no juízo deprecado.

No art. 222, do CPP, encontraremos a obrigatoriedade de intimação das partes quando da expedição da carta precatória, e isto, obviamente, pelo juízo deprecante, o que torna certa a questão "A", bem como as questões "B" e "C".

Resta saber se o defensor deve ser intimado para a audiência que será realizada no juízo deprecado ou se as partes devem ser intimadas da data em que se realizará a audiência no juízo deprecado.

Não há previsão legal para quaisquer das situações, e o tema foi levado ao STF que assim se manifestou:

HC 104767 - Julgamento: 14/06/2011
Órgão Julgador: Primeira Turma
[...] A intimação do advogado para a inquirição de testemunhas no juízo deprecado é desnecessária quando realizada a intimação da expedição da carta precatória. Cabe ao impetrante acompanhar toda a tramitação da precatória perante o juízo deprecado, a fim de tomar conhecimento da data designada para a diligência. (Precedentes: HC 89186, Rel. Ministro EROS GRAU, SEGUNDA TURMA, DJ 06/11/2006; HC 84098/MA, Rel. Ministro ELLEN GRACIE, SEGUNDA TURMA, DJ 20/04/2004). [...]

Logo, as questões "B" e "C" estão erradas, restando somente a questão "A" como certa.   

Não vamos encerrar o assunto, mas acrescentemos uma indagação: E se acaso no juízo deprecado houver Defensoria Pública regularmente constituída e tratar-se de réu hiposuficiente, faz-se necessária a intimação do Defensor Público para a audiência?

A resposta fica para amanhã se Deus o quiser.

Abraço a todos,

quarta-feira, 16 de abril de 2014

A apelação e a contagem de prazo.

Hoje encerramos as postagens da Semana Santa e se Deus o permitir voltaremos na terça feira próxima, o que nos leva á seguinte questão:

Digamos que Mévio tenha sido absolvido de um crime (qualquer um) e a intimação a respeito desta sentença, ao promotor de justiça, tenha se dado na última segunda feira 14/04/2014. Quando findará o prazo para a propositura da apelação? Três pressupostos: a) o prazo para apelação é de 05 (cinco) dias (Art. 593, do CPP); b) sabemos que Mévio é culpado (ok, pode descartar este); c) o primeiro dia útil após o dia 16 de abril, será o dia 22 de abril, ou seja, oitavo dia a partir da intimação.

Deverá o promotor apelar da sentença absolutória até o dia 16 de abril? Ou estará respeitando o prazo apelando apenas no dia 22 de abril?

O prazo é processual, portanto, é no CPP que buscaremos seu regramento. E analisando o CPP encontraremos em seu Art. 798 que os prazos serão contínuos e peremptórios, e que não sofrerão interrupção por férias, domingo ou dia de feriado. Contudo, muito embora não sofram interrupção, do § 3° do mesmo artigo extrai-se que: "O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato."

Em situação similar levada ao STF, colhemos da ementa:

[...]  É tempestiva a apelação interposta pelo Ministério Público no primeiro dia útil após o 5º dia da intimação da sentença absolutória (CPP, art. 593), quando o prazo termina em domingo ou dia feriado (CPP, art. 798, § 3º), aplicando-se o preceito a todas as partes do processo, inclusive quando em prejuízo do paciente. [...] HC 77226

Logo, no caso concreto apresentado, a apelação poderá ser interposta até o dia 22 de abril.


Abraço a todos e o desejo de uma FELIZ PÁSCOA.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Falsificação de atestado de hospital público - Crime do 297 ou 298?

Esta tarde deparei-me com inquérito policial que narrava os seguintes fatos:

a) Mévio arrumou um emprego e então no segundo mês de serviço, a fim de justificar três dias de falta, falsificou um atestado de um hospital público, no qual inseriu informações falsas, inclusive a assinatura do médico local. Após, Mévio apresentou o documento na empresa em que trabalhava.

Uma conclusão é bastante óbvia: Mévio é irrecuperável.

Mas o que nos importa à postagem de hoje são as seguintes indagações:

a) Qual dos falsos realizou Mévio? Aquele com previsão no artigo 297, do CP (falsificação de documento público) ou o do artigo 298 (falsificação de documento particular) do mesmo CP?

Foi bem quem respondeu que o documento falsificado era particular e este será o falso a ser considerado na análise do inquérito.

Segundo Cezar Roberto Bitencourt "por documento público entende-se aquele que é elaborado na forma prescrita em lei, por funcionário público, no exercício de suas atribuições, compreendido o documento formal e substancialmente público ..." in Código Penal Comentado, p. 1052.

O atestado médico não encontra respaldo em tal descrição, eis que não se trata de documento formal ou substancialmente público.

b) É possível a absorção do crime de falso pelo de uso, ou vice-versa? Ou seja, a partir do momento em que Mévio falsificou e fez uso do documento, responderá por ambos os crimes (Art. 298 e 304, do CP), ou apenas por um dos delitos.

Há decisões de que ambos os delitos estão presentes, outras em que o crime de uso absorve o de falsidade e outras no sentido de que o crime de uso será absorvido pelo de falsidade. Fiquemos então com a última do STF a respeito do tema:

HC 84533 / MG - MINAS GERAIS
                          

[...] USO POSTERIOR, PERANTE REPARTIÇÃO FEDERAL, PELO PRÓPRIO AUTOR DA FALSIFICAÇÃO, DO DOCUMENTO POR ELE MESMO FALSIFICADO - "POST FACTUM" NÃO PUNÍVEL [...] .- O uso dos papéis falsificados, quando praticado pelo próprio autor da falsificação, configura "post factum" não punível, mero exaurimento do "crimen falsi", respondendo o falsário, em tal hipótese, pelo delito de falsificação de documento público (CP, art. 297) ou, conforme o caso, pelo crime de falsificação de documento particular (CP, art. 298). Doutrina. Precedentes (STF).- [...]

Abraço a todos,

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Questão de concurso - Inquérito Policial arquivado e novidade de provas.

Vamos começar a semana com uma questão de concurso para magistratura do Paraná (2013). Eis a assertiva:

"Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para adenúncia, a autoridade policial não mais poderá empreender novas investigações, porque a decisão faz coisa julgada."

E então, falso ou verdadeiro?

A lei seca resolve:

CPP - Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícias.

Logo, em havendo notícias de novas provas poderá a autoridade policial proceder novas investigações, portanto a assertiva é falsa.

Atente ainda o leitor para a expressão "... se de outras provas". A questão já gerou tanta controvérsia que foi sumulada pelo STF. A Súmula 524 reforça que não poderá ser proposta ação penal sobre inquérito policial anteriormente arquivado, salvo se novas provas forem juntadas aos autos.

Em suma, sem ao menos notícias de novas provas, o inquérito policial, uma vez arquivado, seguirá arquivado, contudo, com notícia de novas provas, poderá a autoridade policial empreender novas investigações e mediante estas mesmas provas, o MP oferecer a denúncia.

Esquematizando:

INQUÉRITO POLICIAL ARQUIVADO - SEM INFORMAÇÕES DE NOVAS PROVAS

Não poderá a autoridade policial efetuar novas investigações.

INQUÉRITO POLICIAL ARQUIVADO - SEM NOVAS PROVAS

Não poderá o representante do Ministério Público oferecer denúncia.

INQUÉRITO POLICIAL ARQUIVADO - COM NOTÍCIAS DE NOVAS PROVAS

Poderá a autoridade policial empreender novas pesquisas (investigações).

INQUÉRITO POLICIAL ARQUIVADO - COM NOVAS PROVAS

Poderá o representante do Ministério Público oferecer denúncia.



Abraço a todos e o desejo de uma boa semana.






sexta-feira, 11 de abril de 2014

O inquérito policial e a notícia anônima.

Vale a pena ver de novo:

Siga os fatos:
1) Delegado de Polícia recebe denúncia anônima, dando conta do crime de falsidade documental e do local em que poderiam ser encontrados o autor dos fatos e o equipamento para prática do falso.
2) Com base na denúncia anônima formulada instaurou inquérito policial mediante portaria (notitia criminis de cognição direta ou imediata).
 
3) Apurou os fatos conforme narrado na denúncia anônima identificando autor e materialidade do crime de falsificação de documento público, no caso, certificados de conclusão do ensino médio.
 
4) Remetido o inquérito ao Fórum, foi oferecida denúncia pelo membro do Ministério Público (ação pública incondicionada) no prazo legal de 15 dias (réu solto). A denúncia foi recebida depois de defesa preliminar.

5) No Tribunal “Y” o réu impetrou Habeas Corpus objetivando o trancamento da ação penal sob o argumento de que a ação penal contra si promovida tem por base inquérito policial instaurado por notícia anônima, o que seria inconstitucional ante a vedação do anonimato com previsão no art. 5º, IV, da Constituição Federal.

Juridicamente:
 
De fato a Constituição Federal, no disposto supra indicado, reza que: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Neste contexto, no Habeas Corpus n. 84827, impetrado perante o STF, o Ministro Marcos Aurélio expôs que: “Acrescento que se, de um lado, há de se ouvir o cidadão, de se preservar a manifestação do pensamento, de outro, a própria Constituição Federal veda o anonimato – inciso IC do artigo 5°. Sob o ângulo da inviolabilidade da vida privada, é ainda a Carta da República que assegura o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente da inobservância da vedação. É justamente esse contexto que bem diz com a vida de um Estado Democrático de Direito, com a respeitabilidade própria ao convívio das pessoas em cultura satisfatória que direciona à impossibilidade de se agasalhar o denuncismo irresponsável, maculando-se, sem seriedade maior, a vida das pessoas.” Pelo que o STF determinou, no caso, o trancamento de investigação criminal com base exclusiva em denúncia anônima.
 
O assunto não encontra entendimento pacífico, eis que, mesmo que vedado o anonimato, é certo que a investigação criminal pode se iniciar de ofício, ou seja, sem qualquer provocação, conforme art. 5°, inciso I, do CPP. Ademais, a aceitação de que o anonimato da notícia de um delito impede a investigação, seria lançar por terra as ferramentas criadas pelo próprio Estado no sentido de fazer cessar violências que vitimam idosos, crianças e indefesos em geral que encontram defesa em informações anônimas oriundos, de regra, dos parentes e vizinhos. O próprio STF, em decisão posterior, admitiu a realização de investigações preliminares em caso de notícia crime anônima (HC 95244).

Nos parece que a expressão chave da decisão que trancou investigação iniciada em denúncia anônima, acima referida, seria: “agasalhar o denuncismo irresponsável”. Ou seja, a notícia anônima em si não é apta a autorizar ou desautorizar a investigação criminal, sendo que esta deva ser analisada em conjunto com o contexto em que foi oferecida e dos elementos por esta trazidos. 
Logo, creio que a resposta quanto à possibilidade de início da investigação criminal mediante notícia anônima será positiva ou negativa de acordo com as circunstâncias e elementos da notícia anônima em si.
 
No caso concreto que deu início ao presente escrito (no qual adequamos apenas o delito narrado) o Tribunal “Y” não concedeu a ordem de Habeas Corpus sob o fundamento de que a investigação, embora iniciada por notícia anônima se deu com cautela e discrição até que novos elementos de autoria e materialidade fossem colhidos.

Abraço a todos,

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Sistemas de apreciação de provas.

Em viagem pela Holanda passamos por uma cidade chamada Oudwater (ou qualquer coisa parecida). A atração desta cidade era uma balança, uma enorme balança, construída na idade média. Sua utilidade? Pesar as mulheres acusadas de bruxaria. As leves eram consideradas bruxas, as pesadas passavam ilesas. O motivo era óbvio, como voariam se fossem pesadas?

Triste saber que tais instrumentos de fato foram utilizados, mas o que isto importa ao Processo Penal? Importa o fato de que a utilização da referida balança compõe um sistema de apreciação de provas conhecido por ordálias.

O processo penal atual não admite tais sistema de apreciação de provas, o que encontraremos em concursos públicos e no Processo Penal (ao menos brasileiro) são os seguintes sistemas:

a) DA PROVA LEGAL - o legislador aponta como as provas devem ser apreciadas, valorando-as. De tal sistema, aplicado em tempos idos, surgiu por exemplo a expressão: "A confissão é a rainha das provas". Atualmente, poderemos verificar tal situação no que toca à prova do estado de pessoas. Em tais casos, não poderá a prova ser testemunhal ou outra que não aquelas previstas na lei civil (parágrafo único, do Art. 155, do CPP);

b) DA CERTEZA MORAL DO JUIZ OU DA ÍNTIMA CONVICÇÃO - o juiz analisará o que quiser e como quiser, decidindo pela convicção livre de critérios balizadores. Embora ontem tenhamos escrito que os jurados estão vinculados à prova dos autos, sob pena de nulidade do Júri, o fato é que isto é verdadeiro tão somente quando do primeiro júri sobre os fatos, eis que, uma vez anulado este, uma segunda decisão, mesmo que contrária à prova dos autos, não poderá ser objeto de apelação (§ 3°, do Art. 593, do CPP). Pode-se então dizer que o sistema de apreciação de provas de um segundo julgamento do júri, anulado anteriormente por decisão contrária à prova dos autos, é o da íntima convicção;

c) DA LIVRE CONVICÇÃO DO JUIZ OU DA PERSUAÇÃO RACIONAL - é o sistema adotado pelo CPP (com as exceções já vistas) - o juiz decidirá, segundo sua convicção que, contudo, deverá estar vinculada às provas dos autos, sobre as quais não há valoração legal.

Sei que ontem falamos do mesmo assunto, contudo, me pareceu interessante a sistematização acima.


Abraço a todos,


quarta-feira, 9 de abril de 2014

Qual o valor da prova pericial?

Hoje pela manhã participei de Tribunal do Júri (já encerrado), eis os fatos:

a) Sisvaldo (nome fictício que acabou de me passar pela cabeça) foi até a casa do próprio irmão e com duas facas em mãos partiu para cima deste. O irmão esquivou-se dos golpes de faca, caiu ao chão e foi socorrido pelos vizinhos;

b) Silvaldo e o irmão nunca haviam tido qualquer entrevero tampouco houve discussão no dia;

c) Seis meses antes a genitora de Sisvaldo já havia procurado psiquiatra ante o comportamento estranho do filho;

d) Sisvaldo recusou-se à medicação e praticou os fatos acima descritos alegando de nada lembrar-se;

e) Perito forente atestou que Sisvaldo é imputável, eis que plenamente capaz de compreender o ato que praticou;

f) Vários documentos médicos dizem o contrário, sendo o réu diagnosticado com Esquizofrenia Bipolar.

Vamos nos concentrar na questão probatória, pergunta-se: O laudo psiquiátrico oficial é meio de prova absoluto, ou ainda, o laudo oficial deve prevalecer sobre os demais depoimentos e documentos?

A resposta está no sistema de apreciação das provas adotado pelo CPP, qual seja, o da persuação racional ou da livre convicção do juiz, com disposição legal no artigo 155: "O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial ...".

Logo, o juiz (mesmo os jurados) não poderá afastar-se das provas do processo (livre apreciação da prova) contudo não está vinculado a nenhuma valoração entre provas (por exemplo: confissão vale mais que a perícia, ou a perícia vale mais que testemunhas, etc).

A primeira situação posta acima (juiz decidir de forma desvinculada à prova dos autos) caracteriza o Sistema da Íntima Convicção quanto à valoração das provas. A segunda situação (grau de validade das provas) caracteriza  o sistema Da Prova Legal (ou seja, a lei impõe o valor da prova).

No caso concreto posto, embora o laudo pericial aponte imputabilidade, o restante da prova indicou que o réu, quando dos fatos, estava em surto e portanto era inimputável quando da ação.

Ante o princípio da livre apreciação das provas, após exposição destas, requeri aos Senhores Jurados que absolvessem o réu, o que foi atendido.

Abraço a todos,

terça-feira, 8 de abril de 2014

É crime ofender uma empresa?

Vale a pena ver de novo:

Pessoa jurídica vítima de difamação e injúria. É possível?
Nesta tarde recebi vista de ação penal privada promovida por pessoa jurídica contra três querelados. A inicial imputa os crimes de difamação e injúria.
Nos questionamos então: a pessoa jurídica pode ser vítima de difamação e injúria?
 
Segue parte do parecer exarado na ação penal e que responde a nosso questionamento:
 
“Inicialmente, vale ressaltar que nos crimes contra a honra, a pessoa jurídica pode ser sujeito passivo somente de difamação, não, porém, de injúria.

Ora, a pessoa jurídica não possui honra subjetiva, que se traduz no sentimento da própria honorabilidade, elemento caracterizador do crime de injúria. Possuí, contudo, boa ou má reputação, motivo pelo qual pode ser ofendida e difamada.

Vejamos a seguinte decisão proferida pela 2ª Turma do STF, em que foi relator o Ministro Francisco Rezek:
 
A pessoa jurídica pode ser sujeito passivo do crime de difamação; não porém, de injúria ou calúnia.' "E assim o é apenas porque, à pessoa jurídica, não se pode negar reputação e boa fama, que não constituem atributos da honra subjetiva - como na injúria - ; mas sim da honra objetiva. Assim, ninguém poderá pleitear que a pessoa jurídica seja sujeito passivo de injúria ou calúnia. E é assim porque o sentimento de dignidade ou decoro só é concebível numa pessoa física. Mas, na sua reputação, repetimos, a pessoa jurídica pode ser atingida; tanto que essa lesão reflete em seu patrimônio. "Este posicionamento jurisprudencial, além da chancela do eminente e erudito Ministro Rezek, conta com os dos eminentes Ministros: Djaci Falcão, Moreira Alves e Aldair Passarinho" (RTJ-113/90, vol. 113, julho de 1985).
 
No mesmo sentido RHC 83091, Pet 2491 AgR, Inq. 800, todos do STF.”
 
Da mesma forma, os doutrinadores modernos (Capez e Damásio por exemplo) admitem o crime de difamação contra pessoa jurídica.
 
Nosso parecer concluiu pelo seguimento da ação penal, tão somente, quanto ao crime de difamação.
 
Guardemos então, para fins de concurso e prática, a informação de que a pessoa jurídica não é vítima do crime de injúria, o sendo, contudo, do crime de difamação.
 
NA CONTRA MÃO: Para os doutrinadores Hungria e Fragoso a pessoa jurídica sequer pode ser vítima de difamação. Também há decisões do STF, anteriores a 1984, no sentido de que apenas pessoas físicas poderiam sofrer crimes contra a honra. Tais precedentes e doutrinadores nos servem como conhecimento histórico, contudo não aconselho a adoção de tal entendimento em qualquer concurso.

Abraço a todos,

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Mévio e sua representação em um guardanapo.

Hoje é sexta-feira, para alguns o melhor dia da semana, então não vamos estragá-lo com questões difíceis. Vamos a um fato de simples solução:

a) Mévio estava em uma lanchonte quando Tício gentilmente ameaçou-o de morte por não passar o ketchup.

b) Mévio, indignado, pegou um guardanapo, pediu uma caneta para o garçom e escreveu o seguinte:

doutor delega

Hoje a noite, em pleno natal, o tício se passou e falou que ia me matar. e na frente da Rose seu delega. É muita umilhassão, espero que o senhor processe este cara e o bote na cadeia.

c) Mévio saiu do local e foi até a Delegacia, mas o policial de plantão falou que não iria receber o documento, eis que não tinha as formalidade necessárias.


O policial agiu da maneira juridicamente adequada?


A resposta é negativa:

1) O crime de ameaça se processa mediante representação (Ação Público Condicionada);

2) A representação não possui forma prescrita, bastando a simples manifestação de vontade da vítima.

Segundo o STJ:

[...] 4. De acordo com entendimento já pacificado nesta Corte Superior de Justiça, a representação da vítima ou de seus representantes legais para a investigação ou deflagração de ação penal, nos casos em que esta é condicionada àquela manifestação, prescinde de qualquer rigor formal, bastando a demonstração inequívoca da parte interessada, o que ocorreu na hipótese dos autos. [...] (AgRg no REsp 1110889 / SC).

Logo, o guardanapo do Mévio serve sim como representação, legitimando o delegado à investigação e o Ministério Público para a propositura da ação penal.

Abraço a todos,

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Sequestro em uma cidade e cativeiro em outra. Qual o Juizo competente?

Siga os fatos:

a) Mévio e Tício planejaram extorsão mediante sequestro; para tanto se dirigiram à cidade de Curitiba/PR e após verificarem as atividades cotidianas da vítima Ermenegildo, acabaram por sequestrá-lo, levando-o para cativeiro na cidade de São Paulo.

b) Ato contínuo Mévio e Tício se utilizaram de telefone situado na cidade do Rio de Janeiro para exigir o dinheiro dos familiares da vítima.

c) O dinheiro foi depositado em conta da cidade de Belo Horizonte, onde foi resgatado por um comparsa de Mévio e Tício e posteriormente distribuído entre o bando.

Qual das capitais será competente para o processamento e julgamento do feito?

Depende.

Dependerá de qual juiz "tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa" (Art. 83, do CPP). Isto porque há crime único de caráter permanente, pelo que todos os quatro locais guardam competência para o julgamento dos fatos, recaindo a responsabilidade ao local que primeiro tomar alguma medida processual.

É o que  dispõe o artigo 71, do CPP (basta conferir).

Abraço a todos,

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Mévio e Ticiana são promotores de justiça e casados entre si. Podem atuar no mesmo processo?

No estado em que atuo há um Promotor de Justiça e uma Promotora de Justiça casados entre si, os chamemos de Mévio e Ticiana. Coincidentemente Ticiana está atuando em promotoria outrora ocupada pelo esposo.

Eis que então Ticiana atuou em Tribunal do Júri em processo no qual o marido oficiou anteriormente.

O réu foi condenado, mas o Tribunal de Justiça anulou o julgamento ex offício sob o argumento de que a Promotora estaria impedida de atuar no caso em face de impedimento legal.

Como fundamento jurídico o Tribunal utilizou-se do Artigo 258 e 252, I, ambos do CPP.

Os dispositivos invocados, demonstram a preocupação quanto à imparcialidade do julgador e da atuação do representante do Ministério Público, contudo, em nenhum momento verifica-se qualquer circunstância apta à ofender a imparcialidade a tão simples sucessão de promotores de justiça casados entre si (ou que outro parentesco guardem).

Especificamente com relação ao Ministério Publico o impedimento do artigo 258, refere-se a partes outras que não o próprio MP, autor da ação penal ou fiscal nos casos de ação penal privada, pelo que a mera sucessão de promotores não maculará o feito.

O entendimento de que a sucessão de promotores casados entre si é causa de nulidade em face de impedimento na atuação, levaria à interpretação de que, em nenhum local, dois promotores amigos (situação bastante comum) ou parentes, poderiam atuar em processos anteriormente examinados por seus amigos e parentes promotores, quando, de fato, ambos representam a mesma parte do processo, qual seja, o Ministério Público.

Portanto, a questão foi levada ao STJ que, mencionando no corpo do Acórdão precedente do STF, assim decidiu:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO. ATUAÇÃO DE
MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CÔNJUGES.
IMPEDIMENTO. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTE DA
CORTE SUPREMA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO .
1. Inexiste impedimento de atuação de cônjuges membros do
Ministério Público em um mesmo processo.
3. Precedentes do STF.
4. Recurso especial provido.

Portanto, Ticiana poderá continuar a fazer os Júris e atuar nos processos em que atuou anteriormente o seu esposo Mévio.

Abraço a todos,

terça-feira, 1 de abril de 2014

Mévio passa cheque sem fundo - quem julga?

Competência - cheque sem fundo
Vale a pena ver de novo:
 
Siga os fatos:

1) "A", domiciliado e residente na cidade e comarca de Curitiba/PR se dirigiu até a cidade e comarca de São Bento do Sul/SC onde adquiriu diversos móveis com os quais presenteou um parente morador da cidade e comarca de São Francisco do Sul/SC.

2) "A" pagou para "B" (dono da loja de móveis) com um cheque de R$ 12.000,00 (doze mil reais).

3) O cheque não foi pré-datado sendo que "B" efetuou o depósito da referida cártula, no dia seguinte à compra, em sua conta corrente do Banco do Brasil localizado na cidade de São Bento do Sul.

4) O cheque retornou para "B" eis que não contava com provisão de fundos.

5) Após inquérito policial ofereci a denúncia contra "A" na cidade e comarca de Joinville/SC.

Por que?

Não é o fato de que Joinville está mais ou menos no meio do caminho entre os municípios de Curitiba e São Bento do Sul (tal regra de competência - equidistância - não será encontrada no CPP).

Dentre os fatos está faltando um dado relevante, qual seja, qual era a agência bancária do emissor do cheque, no caso, "A", eis que esta agência é a responsável pela recusa do pagamento ante a falta de fundos.

Informemos então, a agência bancária estava situada na cidade de Joinville/SC. A partir deste dado passamos a aplicar a teoria do resultado, adotada e expressa no CPP em seu artigo 70: "A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração [...]".

Contudo, muitos ainda questionaram aos tribunais: mas o resultado, no caso da emissão do cheque sem fundo, não se dá no local em que se realizou o negócio? A resposta é negativa e resultou em duas súmulas, uma do STF e outra do STJ, vejamos:

Súmula 521 do STF: "O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado."

Súmula 244 do STJ: "Compete ao foto local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos."

Logo, a denúncia oferecida respeitou as regras da competência em razão do local (ratione loci).

Abraço a todos,