quarta-feira, 18 de junho de 2014

Joaquim Barbosa e a suspeição.

No decorrer desta semana o Ministro do STF, Joaquim Barbosa, deixou a relatoria das execuções penais relativas à Ação Penal 470 (mensalão).

A decisão foi tomada após discussão entre advogado e ministro veiculada nacionalmente e a consequente representação criminal formulada pelo Ministro por ameaça proferida pelo Advogado.

Vamos ao que interessa sob a ótica do Processo Penal.

Na lei processual encontraremos causas que impedem o exercício da jurisdição e outras que tornam suspeito o julgador, assim:

1) São causas de impedimento (não poderá exercer jurisdição):

a) a atuação no processo de cônjuge ou parente até terceiro grau (em qualquer função dentro do processo, mesmo a de delegado, auxiliar da justiça ou parte);

b) a própria atuação no processo em desempenho de quaisquer funções que não de juiz, ou ainda como parte;

c) a própria atuação no processo em instância inferior, desde que tenha se pronunciado sobre a questão.

2) São causas de suspeição:

a) a amizade (íntima) ou inimizade (capital) com qualquer das partes;

b) se o magistrado, cônjuge, ascedente ou descendente responder a processo análogo, cujo caráter criminoso haja controvérsia;

c) se pessoalmente ou algum parente (até terceiro grau) sutentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;

d) se tiver aconselhado qualquer das partes;

e) se for credor, devedor, tutor ou curador de qualquer das partes;

f) se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.


Estas são as causas arroladas pelo CPP que causam impedimento ou suspeição do julgador. Basta então verificar em qual delas podemos enquandrar a situação vivida no STF.

Abraço a todos,

terça-feira, 10 de junho de 2014

Requisitos à prisão preventiva.

Nesta tarde, recebi inquérito policial com representação da autoridade policial pela prisão preventiva de Mévio e Tício (sim os nomes são fictícios), eis os fatos:

a) Mévio e Tício praticaram assalto na cidade de Itajaí/SC, pelo qual foram reconhecidos em dia posterior;

b) Ambos ainda foram reconhecidos pelo comprador dos produtos subtraídos por ambos;

c) No decorrer das investigações, Mévio e Tício entraram em contato com a vítima, via telefone, ameaçando-a caso os entregasse à polícia;

d) A autoridade policial representou pela prisão preventiva com fundamento na garantia da ordem pública, eis que Mévio e Tício possuem reincidência em crime da mesma espécie.

Processualmente o que temos:

1) Um instrumento adequado: enquanto o representante do Ministério Público, o querelante ou o assistente requerem a prisão preventiva, a autoridade policial representa pela prisão preventiva (Art. 311, do CPP).

2) Uma fundamentação insuficiente: tendo em vista o fato de que os indiciados mostram-se voltados à atividades criminosas, das quais não se afastaram após condenação anterior, entendo que possível a interpretação que ordem pública estará prejudicada com os réus soltos (há entendimentos diversos), contudo, o requisito óbvio a autorizar a prisão preventiva é a ameaça à testemunha, ou seja, a prisão dos indiciados (futuros réus) visa a conveniência da instrução criminal. (Art. 312, do CPP).

Em suma, ante a existência de indicios de autoria e prova da existência do crime + conveniência da instrução criminal, possível a prisão preventiva dos indiciados, conforme representado pela autoridade policial. Neste sentido oferecido o parecer.

Abraço a todos,

 

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Da proibição da oitiva de determinadas testemunhas.

Postagem curta, porque hoje é sexta:

Em matéria de prova em processo penal, importante saber que algumas testemunhas são proibidas de depor.

Segundo o artigo 207, do CPP, são proibidas de depor, aqueles que em razão da profissão, ofício ou função devam guardar segredo. Dentre estes poderíamos citar o sacerdote, o advogado, médico, juiz ou membro do Ministério Público que atuaram no inquérito ou processo.

Todavia, a lei abre exceção caso a parte interessada desonere o profissional, lembrando que a parte interessada não é só aquele que repassou a informação, mas, segundo parte da doutrina, também o órgão de classe ao qual pertence o profissional.

Por fim, destacamos que  a proibição não se vincula à profissão ou ao profissional em si, mas ao conteúdo do que porventura saiba por conta da profissão, logo, não estará um advogado proibido de depor sobre um crime qualquer que tenha presenciado.

Por hoje é só,

Abraço a todos,

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Um processo, dois juízes. E o princípio da identidade física?

Segue interessante decisão do STF:
 
Negado HC que pedia nulidade de processo por atuação de dois juízes

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu o pedido de Habeas Corpus (HC 121624) impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que a defesa de um condenado pedia a nulidade do processo alegando a não observância do princípio da identidade física do juiz, pois o magistrado que proferiu a sentença não foi o mesmo que presidiu a instrução processual (produção de provas). De acordo com o ministro, a atuação do juiz substituto neste caso se enquadra nas exceções previstas no artigo 132 do Código de Processo Civil (CPC), não configurando constrangimento ilegal a ser reparado.
De acordo com os autos, o sentenciado comercializava CDs e DVDs piratas e medicamentos sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que resultou em sua condenação à pena de 12 anos de reclusão, em regime inicial fechado, e mais 20 dias-multa, pela prática dos crimes de violação de direito autoral (artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal – CP) e falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (artigo 273, parágrafo 1º-B, I, do CP).
A defesa alega que o fato de a sentença ter sido proferida por juiz substituto em abril de 2009, durante período de férias do juiz titular da 2ª Vara da Comarca de Barra Grande (SP), que presidira a instrução, e que a decisão foi publicada depois que o juiz titular já havia retornado a suas funções, violando os princípios da identidade física do juiz e o do juiz natural.
Decisão
O ministro Gilmar Mendes destacou que o princípio da identidade física do juiz apenas foi expressamente introduzido no Código de Processo Penal (CPP) com o advento da Lei 11.719/2008, que incluiu no artigo 399 dispositivo estabelecendo que o juiz que presidiu a instrução deverá também proferir a sentença. Ressaltou, entretanto, que a aplicação do princípio não é absoluta, permitindo flexibilização nas situações excepcionais previstas no artigo 132 do CPC, como nas hipóteses de convocação, licença, promoção, aposentadoria ou afastamento do magistrado por qualquer motivo.
Citando precedentes das duas Turmas do STF, o relator observou que a jurisprudência do Tribunal é no sentido de que exista correlação entre as provas colhidas durante a instrução e a sentença, ainda que proferida por outro magistrado. O relator destacou o Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 116205, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, que assenta a necessidade de moderação na aplicação do princípio do juiz natural de forma que a sentença seja anulada apenas “nos casos em que houver um prejuízo flagrante para o réu ou uma incompatibilidade entre aquilo que foi colhido na instrução e o que foi decidido”.
O ministro Gilmar Mendes entendeu não haver qualquer vício a ser reconhecido no caso. Destacou que o fato de o juiz titular encontrar-se de férias quando da conclusão dos autos para sentença é uma situação que se enquadra na expressão “afastado por qualquer motivo”, disposta no artigo 132 do CPC, que deve ser aplicado por analogia ao processo penal.
“Da mesma forma, é irrelevante a alegação de que o juiz titular teria retornado às suas funções antes da publicação da sentença, haja vista que no momento em que foi prolatada o referido magistrado ainda encontrava-se no gozo das férias”, concluiu o relator.
Competência
O ministro indeferiu monocraticamente o HC com base no artigo 192, caput, do Regimento Interno do STF, que delega competência ao relator para julgar, individualmente, pedidos de habeas corpus, desde que a matéria versada nos autos seja “objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal”.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Queixa crime já recebida. Perdão ou renúncia?

Na presente data me deparei com autos que apresentaram a seguinte situação:

a) Mévio ofereceu queixa-crime contra Tício, em face de calúnia, injúria e difamação por este praticadas;

b) Não houve conciciliação em audiência prévia;

c) Apresentada defesa preliminar e designada audiência de instrução e julgamento, Mévio apresentou em juízo a informação de que houve acordo na esfera cível e requereu a extinção da punibilidade pela renúncia ao processo.

Acertado o pedido de Mévio?

Nos parece que não, o momento à renúncia é anterior à queixa-crime e não posterior a esta, quando o instituto adequado é o perdão. Por sua vez, apresentado o perdão, deverá o querelado se manifestar a respeito do seu aceite no prazo máximo de três dias, o qual será presumido ante o silêncio da parte.

Em suma, em parecer lançado nos autos, nos manifestamos pelo recebimento da renúncia como se perdão fosse e pela intimação do querelado para manifestar-se no prazo máximo de três dias.

Abraço a todos,

terça-feira, 3 de junho de 2014

A falta de defesa preliminar em processo de tóxicos.

Na data de ontem analisei processo em que ocorreram os seguintes fatos:

a) Mévio foi denunciado, em 27/01/2010, por infração ao artigo 33, da Lei 11343/06 (tráfico ilícito de entorpecentes);
b) A notificação para fins de defesa preliminar foi cumprida em 22/02/2010;
c) A defesa preliminar, na qual constava rol de testemunhas, foi juntada aos autos em 08/03/2010;
d) Em 23/04/2010, a defesa preliminar, bem como o rol de testemunhas, não foram recebidos por intempestivos e o processo teve sequência com a designação de data para fins de audiência de instrução e julgamento.
e) Mévio foi condenado pelo crime praticado.

Segundo a Lei 11343/06, artigo 55, a defesa terá o prazo máximo de 10 (dez) dias para apresentar defesa preliminar, oportunidade para arrolar suas testemunhas, pelo que, de fato, intempestiva a defesa preliminar apresentada por Mévio.

Contudo, muito embora acertada a decisão quanto ao não recebimento da peça extemporânea, o fato é que a defesa premilinar é peça obrigatória e condição para  o posterior recebimento, ou não, da denúncia. Os doutrinadores Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho inclusive conceituam a defesa preliminar como condição de procedibilidade ou condição específica da ação. (Lei de Drogas - Comentada Artigo por Artigo. 2 ed. São Paulo: Método, 2008, p. 264).

Em apelação, Mévio alegou o cerceamento de defesa, no que obteve sucesso, com a anulação do feito a partir do recebimento da denúncia. Da decisão do Tribunal Catarinense extraímos:

"Assim, declara-se a nulidade do processo em relação ao acusado, a partir do recebimento da denúncia, inclusive , a fim de oportunizar a apresentação de defesa preliminar pela defesa do acusado, respeitando-se, o procedimento previsto nos arts. 55 e seguintes da Lei n. 11343/6, prejudicados os mérito do recurso interposto pelo apelante." Ap. Criminal 2010.070687-3.

Entendemos adequada a anulação do feito, contudo discordamos da forma operada pelo Tribunal, eis que a nosso ver, a ordem adequada seria pelo recebimento da peça defensiva, com exceção do rol de testemunhas, em face do princípio da Ordem Processual, dando-se continuidade ao feito a partir de então.

Abraço a todos,


segunda-feira, 2 de junho de 2014

Financiamento mediante fraude e competência.

No início da tarde de hoje recebi inquérito policial iniciado por  notitia criminis na qual uma empresa de financiamento informou a obtenção de um financiamento mediante uso de documentos falsos (fraude).

O inquérito policial foi concluído e então remetido ao fórum da Comarca de Itajaí/SC (Justiça Estadual) e, após, distribuído para a Promotoria de Justiça em que atuo.

O inquérito policial logrou apurar a autoria do fato narrado pela empresa financeira, contudo, não foi possível, neste momento, o oferecimento da denúncia, não em face da necessidade de novas diligências, mas sim, em virtude da incompetência da Justiça Estadual para processamento e julgamento do feito.

Muito embora o crime se assemelhe ao estelionato com previsão no Código Penal, o fato é que há crime específico, qual seja, aquele com previsão no artigo 19, da Lei 7492/86: "Obter, mediante fraude, financiamento em instituição financeira: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa."

Por sua vez, da mesma Lei, em seu artigo 26, colhe-se: "A ação penal, nos crimes previstos nesta Lei, será promovida pelo Ministério Público Federal, perante a Justiça Federal."

Mas a Constituição não alterou tal competência? A nosso ver a resposta é negativa, o que também entende o STJ:

[...] OBTENÇÃO, MEDIANTE FRAUDE, DE FINANCIAMENTO EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. [...] STJ 2001/0239748-0 - julgado em 28/11/2012.

Logo, a competência para o julgamento nos casos de obtenção de financiamento mediante fraude é da Justiça Federal.

Abraço a todos,