1) Em um primeiro caso, Tibúrcio foi denunciado
por infração ao artigo 33, da Lei 11343/06, eis que trazia consigo 39 pedras (5
gramas) de substância entorpecente conhecida vulgarmente como crack.
2) Já no segundo caso, Mévio foi denunciado, por
infração ao artigo 33, da Lei 11343/06 e, em concurso material, por infração ao
artigo 329, do CP, eis que, trazia consigo 58 pedras (9 gramas) de substância entorpecente conhecida
vulgarmente como crack, bem como resistiu à ordem de prisão mediante violência.
3) Em ambos os processos foram arrolados dois
policiais militares como testemunhas da denúncia e nenhuma testemunha de defesa
foi apresentada.
4) Com relação ao primeiro caso, tão logo aberta
a audiência foi o réu interrogado (1). Na seqüência foram ouvidos os policias
militares (2) e, ao final, feitas as alegações finais orais (3).
5) No segundo caso, tão logo aberta a audiência,
foram ouvidos os policiais militares (1), na seqüência foi interrogado o réu
(2) e, ao final, foram feitas as alegações finais orais.
Escrevemos então que o rito da Lei de Drogas faz
previsão do interrogatório como primeiro ato da audiência de instrução e
julgamento, enquanto que o Código de Processo Penal faz previsão de que este
seria o último ato a ser realizado.
Concluímos que em virtude da especialidade da lei
de drogas e do primeiro caso tratar exclusivamente de crime inscrito na
referida lei, acertada a adoção do rito previsto naquela.
Deixamos para hoje o segundo caso, qual seja, em
que a denúncia traz crime previsto na Lei 11.343/06 em conexão com infração do
Código Penal.
Evidente que o segundo caso traz um conflito de
ritos ante a conexão. A antiga Lei de Tóxicos (6.368/76 – art. 28) resolvia a
questão pela gravidade do crime, informando que o rito a ser adotado seria
aquele aplicável ao crime mais grave. Tal disposto não foi repetido pela atual
Lei de Drogas, pelo que há dúvida sobre o rito adequado a ser adotado.
No caso concreto apresentado foi adotado o rito
ordinário com previsão no Código de Processo Penal, realizando-se o
interrogatório ao fim da audiência de instrução e julgamento, o que,
teoricamente, amplia as oportunidades de defesa e contraditório do réu.
Os tribunais superiores não possuem indicação
segura para a solução do conflito instaurado pela conexão.
Há decisões do STJ que alegam ser adequado o rito
da Lei de Drogas, em face do princípio da especialidade. Vejamos:
[...] TRÁFICO
DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO (ARTIGO DA LEI 11.343/2006 E ARTIGO 14
DA LEI 10.826/2003). APONTADA NULIDADE DO PROCESSO EM FACE DA INOBSERVÂNCIA DA
ORDEM DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS E DO ACUSADO PREVISTA NO ARTIGO 400 DO
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ADOÇÃO DE RITO
PREVISTO EM LEGISLAÇÃO ESPECIAL.
1. A Lei
11.343/2006 regulamenta o procedimento a ser seguido nas ações penais
deflagradas para a apuração da prática dos delitos ali descritos, dentre os
quais o de tráfico de entorpecentes,
estabelecendo,
assim, rito especial em relação ao
comum ordinário, previsto no Código de Processo Penal.
2. Por
conseguinte, e em estrita observância ao princípio da especialidade, existindo rito próprio para a apuração do delito atribuído
ao paciente, afastam-se as regras do procedimento comum
ordinário
previstas no Código de Processo Penal, cuja aplicação pressupõe, por certo, a
ausência de regramento específico para a hipótese.
3. Se a Lei 11.343/2006
determina que o interrogatório do
acusado será o primeiro ato da audiência de instrução e julgamento, ao passo que
o artigo 400 do Código de Processo Penal prevê a realização de
tal ato
somente ao final, não há dúvidas de que deve ser aplicada a legislação
específica, pois, como visto, as regras do procedimento comum ordinário só têm
lugar no procedimento especial quando nele
houver
omissões ou lacunas. [...] (HC 184530
– julgado em 05/02/2013).
Por sua vez, do STF, colhemos:
[...] Paciente que responde
pela prática de crimes para os quais estão previstos ritos processuais
diferentes. Possibilidade de adoção do procedimento ordinário, previsto no
Código de Processo Penal, por ser o mais abrangente e capaz de assegurar, em
sua totalidade, o direito ao contraditório e à ampla defesa. [...] (RHC 101889/RJ – julgado em
11/05/2010).
Ou seja, ante a diversidade de entendimentos, nos parece que os tribunais
superiores estão decidindo com base no velho brocardo francês do pás de nullité sans grief, expresso no
art. 563, do CPP: Nenhum ato será
declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a
defesa.
Deve o leitor acompanhar futuras decisões, no sentido de verificar quanto
à pacificação de um ou outro entendimento, ou seja, seguir-se-á o rito da Lei
de Drogas, em face do princípio da especialidade, ou o rito do CPP, em face de
sua maior abrangência e com relativa vantagem defensiva. Por enquanto, ambos os ritos estão sendo aceitos,
Abraço a todos e o desejo de uma boa semana.
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