1) O Ministério Público recebe inquérito
policial, onde estão narrados vários crimes de tortura e seus autores;
2) Com base no referido inquérito, o Promotor de
Justiça apresenta denúncia por tortura contra os policiais A, B, C, D, E, F e G;
3) Em outro momento, o mesmo promotor, recebe inquérito
que trata dos mesmos fatos, onde, analisando com maior atenção, verifica que
também participou dos fatos o policial H, pelo que oferece nova denúncia, desta
feita, contra H;
4) O primeiro inquérito já informava da
participação do policial H;
5) H, por seu defensor, pede o trancamento da ação
penal, eis que, segundo seu entendimento, em face do princípio da
indivisibilidade, o que ocorreu quando da análise do primeiro inquérito e denúncia,
foi o arquivamento implícito, pelo que, sem novas provas não é possível a
apresentação de denúncia contra H.
6) O pedido foi rejeitado.
A questão é: H possuía ou não razão em suas
argumentações?
Há uma série de princípios que regem a ação penal
pública, assim como há princípios que regem a ação penal privada. No que toca à
ação penal pública, algumas doutrinas trazem como princípio a indivisibilidade.
Tais doutrinas, informam que não cabe ao membro
do Ministério Público escolher quem será denunciado dentre os autores de um
crime, antes, deverá apresentar denúncia única contra todos os autores, salvo
desconhecida a autoria.
Como consequência lógica da indivisibilidade
estaria a interpretação de que há arquivamento tácito ou implícito quando o
Ministério Público silencia quanto a qualquer dos autores do fato criminoso.
Contudo, em melhor análise, verificamos que o
princípio aplicável à ação penal pública não é o da indivisibilidade, mas sim,
o da indisponibilidade ou da obrigatoriedade, ou seja,
independentemente de em uma mesma denúncia ou não, está obrigado o Ministério Público
ao oferecimento da denúncia caso verifique autoria e materialidade. Paralelo a
isto, não há no ordenamento jurídico pátrio
o chamado arquivamento implícito ou tácito.
Levada a questão ao STF, foi proferido o seguinte
julgamento:
EMENTA:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ALEGAÇÃO DE ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO.
INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PACIENTE DENUNCIADO PELO CRIME DE TORTURA
APENAS NA SEGUNDA DENÚNCIA. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE
DA AÇÃO PENAL PÚBLICA. NÃO APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE NESSA
HIPÓTESE. ORDEM DENEGADA. PRECEDENTES DA CORTE. I – Alegação de ocorrência
de arquivamento implícito do inquérito policial, pois o Ministério Público
estadual, apesar de já possuir elementos suficientes para a acusação, deixou de
incluir o paciente na primeira denúncia, oferecida contra outros sete
policiais civis. II – Independentemente de a identificação do paciente ter
ocorrido antes ou depois da primeira denúncia, o fato é que não existe, em
nosso ordenamento jurídico processual, qualquer dispositivo legal que preveja a
figura do arquivamento implícito, devendo ser o pedido formulado expressamente,
a teor do disposto no art. 28 do Código Processual Penal. III – Incidência
do postulado da indisponibilidade da ação penal pública que decorre do elevado
valor dos bens jurídicos que ela tutela. IV – Não aplicação do princípio da
indivisibilidade à ação penal pública. Precedentes. V – Habeas corpus
denegado. (HC 104356 / RJ - Julgamento:
19/10/2010)
Logo, segundo o STF, de cujo entendimento
compartilhamos, não há razão nas argumentações de H, sendo incabível o reconhecimento do arquivamento implícito ou ainda o princípio da indivisibilidade.
Abraço a todos,
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