terça-feira, 4 de junho de 2013

Crime anterior e receptação - há conexão?

Ontem falamos sobre a possibilidade do Tribunal do Júri julgar crimes que não necessariamente os dolosos contra a vida, inclusive, no caso concreto apresentado, os senhores jurados responderam sobre um crime de receptação. Vimos que, no caso, havia conexão entre o crime doloso contra a vida e os demais crimes, dentre estes a receptação, o que deu causa à união dos processos e atraiu a competência para o Tribunal do Júri.

Hoje trataremos da questão específica do crime de receptação e sua necessária, ou não, conexão com o crime anterior e posterior.

Tomemos como ponto de partida o seguinte caso:

1) Tiburcio praticou roubo, com a causa de aumento do uso de arma de fogo, na Comarca “X”, sendo que, uma semana após, Mévio adquiriu referido veículo, na Comarca “Y”, mesmo sabedor que se tratava de fruto de crime anterior.

2) Com o veículo em mãos, Mévio dirigiu-se à Comarca “Z”, onde possuía residência, onde trocou as placas verdadeiras por falsas e adulterou a numeração do chassi.

Os crimes estão previstos nos artigos 157, § 2°, I, 180 e 311, todos do CP.

Pergunta-se: O Juiz de qual Comarca será competente para o julgamento de Tiburcio e de Mévio? “X”, “Y” ou “Z”?

A resposta depende da solução de outra questão: Há conexão entre os fatos?

Segundo o CPP haverá conexão nos seguintes casos:

Art. 76. A competência será determinada pela conexão:

I – se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;
II – se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas;
III – quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.

Descartamos, de plano, o inciso I (Conexão Intersubjetiva por simultaneidade, por concurso e por reciprocidade).

Sob o texto do inciso II, nos parece que não conseguimos enquadrar o roubo e a receptação, eis que a última não se deu para facilitar ou ocultar o primeiro, tampouco para obtenção de vantagem ou impunidade. Contudo, este é o caso da adulteração chassi (Art. 311, do CP), eis que esta se dá justamente para a obtenção de vantagem e ocultação sobre a receptação anteriormente realizada. Ou seja, podemos dizer que entre a receptação e a adulteração de chassi há Conexão Objetiva Consequencial (quando uma infração serve para ocultar a outra).  

Resta por fim a análise quanto ao inciso III, sendo que, no caso concreto apresentado não há descrição de que a prova quanto ao crime de receptação influencie na prova do roubo, ou vice-versa, pelo que não há elementos que permitam a conclusão pela Conexão Instrumental ou Probatória.  

Em suma, ante o quadro apresentado, haverá conexão, e conseqüente união de processos  entre os crimes de receptação e adulteração de chassi, mas não haverá união de processos quanto a estes delitos e o roubo praticado.

Como resposta à indagação inicial podemos então afirmar que Tibúrcio responderá a ação penal, pelo roubo praticado, na Comarca “X”.  Enquanto, os fatos praticados por Mévio, embora cometidos em comarcas diversas, será apurado em um único processo.

Amanhã seguimos quanto à Comarca juridicamente adequada ao julgametno de Mévio.

Abraço a todos,  

Um comentário:

  1. Professor, não haveria entre o crime de receptação do veiculo e o de roubo do mesmo necessária conexão probatória? Pois para que se comprove a receptação é necessária comprovação da origem ilícita do bem, que nesse caso também é a comprovação do roubo

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