sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Competência - relativização da teoria do resultado.

Nas últimas postagens verificamos que, como regra geral, local do crime é o local de sua consumação (onde produziu o resultado) - Art. 70, do CPP. Portanto, o CPP adota a TEORIA DO RESULTADO como diretriz para determinar o local do crime e por consequência como fator determinante da Competência.

Logo, se Mévio subtrai um residência na cidade de Curitiba, pouco importa onde Mévio tenha planejado o delito, ou mesmo de onde tenha saído na manhã do crime, ou ainda onde tenha gastado o dinheiro subtraído, a competência para o processamento do feito será a capital paranaense.

Contudo, a prática levou a flexibilidade da regra legal. Imagine o leitos o seguinte caso:

Mévio, residente na pequena cidade de Descanso/SC, resolve acabar com um desafeto, vizinho de porta, e desfere contra este três tiros sendo que em virtude dos ferimentos causados a vítima veio a ser transportada para o maior centro urbano próximo, qual seja, Chapecó (aproximadamente 100 quilômetros distante). No hospital da cidade de Chapecó, a vítima não resiste aos ferimentos e vem a óbito.

Segundo a teoria do resultado, adotada pelo CPP, o processo e o julgamento pelo Tribunal do Júri, teriam sede na cidade de Chapecó. Contudo, tal posição da lei retira do Tribunal do Júri o caráter do julgamento no seio da sociedade onde ocorreu o crime, desvirtuando o instituto do Júri Popular.

Portanto, nos casos dos crimes dolosos contra a vida a doutrina e jurisprudência tem relativizado a teoria do resultado, admitindo ser o local do crime o local da ação e não o da morte.

Sobre o assunto o STJ editou a seguinte decisão;
 
HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO.  ATOS EXECUTÓRIOS. CONSUMAÇÃO DO DELITO EM LOCAL DIVERSO.TEORIA DO RESULTADO. POSSIBILIDADE DE RELATIVIZAÇÃO. INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA DA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL PENAL. BUSCA DA VERDADE REAL. FACILITAÇÃO DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. COMOÇÃO POPULAR JULGAMENTO EM FORO DIVERSO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃODE EVENTUAL PREJUÍZO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO.
 
1. Segundo o disposto no inciso I do art. 69 do Código de ProcessoPenal, tem-se como regra para a determinação da competência jurisdicional o lugar da infração penal, sendo o que se denomina decompetência ratione loci, visto ser o local que presumivelmente é tido como o que permite uma natural fluidez na produção probatória em juízo, razão pela qual deve o agente ser aí punido.
 
2. A competência para o processamento e julgamento da causa, em regra, é firmada pelo foro do local em que ocorreu a consumação do delito (locus delicti commissi), com a reunião de todos os elementos típicos, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Adotou-se a teoria do resultado. (Art. 70,  caput, do CPP).
3. No caso concreto, aplicando-se simplesmente o art. 70 do Código de Processo Penal, teríamos como Juízo competente o da comarca de Nazaré Paulista/SP, onde veio a falecer a vítima.
 
4. O princípio que rege a fixação de competência é de interesse público, objetivando alcançar não só a sentença formalmente legal, mas, principalmente, justa, de maneira que a norma prevista no caput do art. 70, do CPP, não pode ser interpretada de forma absoluta.
5. Partindo-se de uma interpretação teleológica da norma processual penal, em caso de crimes dolosos contra a vida, a doutrina, secundada pela jurisprudência, tem admitido exceções nas hipóteses em que o resultado morte ocorrer em lugar diverso daquele onde se iniciaram os atos executórios, ao determinar que a competência poderá ser do local onde os atos foram inicialmente praticados.
 
6. O motivo que levou o legislador a estabelecer como competente o local da consumação do delito foi, certamente, o de facilitar a apuração dos fatos e a produção de provas, bem como o de garantir que o processo possa atingir à sua finalidade primordial, qual seja,a busca da verdade real.
 
7. Embora, no caso concreto, os atos executórios do crime de homicídio tenham se iniciado na comarca de Guarulhos/SP, local em que houve, em tese, os disparos de arma de fogo contra a vítima, enão obstante tenha se apurado que a causa efetiva da sua morte foi asfixia por afogamento, a qual ocorreu em represa localizada na comarca de Nazaré Paulista/SP, tem-se que, sem dúvidas, o lugar que mais atende às finalidades almejadas pelo legislador ao fixar acompetência de foro é o do local em que foram iniciados os atos executórios, o Juízo de Guarulhos/SP, portanto.
 
8. O local onde o delito repercutiu, primeira e primordialmente, demodo mais intenso deve ser considerado para fins de fixação da competência.
 
[...]
 
Portanto, nos crimes dolosos contra a vida há relativização da teoria do resultado como local do crime.
 
Abraço a todos e o desejo de um bom final de semana.
 

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